04 June 2025

sEr iMigRaNtE...


Já estou a ler o último livro do Manuel da Silva Ramos  ("Os cosmólogos não vão para o céu") onde o personagem principal visita o Monte dos Carvahos e pede-me para dar umas dicas de construção em terra . Uma boa leitura, entre ficção e realidade. que retrata a cultura e as gentes da Beira Baixa nos dias de hoje... e também uma ousada sátira aos movimentos extremistas de direita que infelizmente se levantam pelo país fora, incitando as populações ao racismo, ao medo do "outro" e instigando a rejeição de imigrantes como ameaça à segurança nacional... Vale a pena ler... Retrata muito bem outros personagens que se mudaram para o Fundão nos últimos anos e que nós também conhecemos pessoalmente...o Alejandro, um génio Boliviano, poeta, músico e cineasta entre muitas outras coisas... Yahya Hussein, um refugiado do Sudão que foi colega da Emma quando trabalhou no Fundão como mediadora entre várias culturas...os cineastas João Dias, José Oliveira e Marta Ramos também são mencionados várias vezes e o verdadeiro Fundanense, o cineasta Mário Fernandes, que na sua modéstia teceu todos estes relacionamentos com o autor do li
vro.

Achei interessante ser também retratada como imigrante...e como Angolana... escrevo este artigo porque me fez refletir sobre as minhas origens familiares e diferentes participações na sociedade que é hoje Portugal... Sou apresentada como mais uma imigrante no Fundão, juntamente com o Alejandro e o Yahya. Já vivo aqui há quase 19 anos, numa quinta de 5 hectares que regenerei seguindo as éticas e princípios da Permacultura. Nasci sim em Angola, em novembro de 1974... no meio de uma guerra... Nessa altura civil, pois o governo colonial português foi simplesmente abandonado, assim como as centenas de milhares de portugueses que ali viviam, fugidos da ditadura e frieza da Europa. Quando os meus pais tiveram que fugir em 1975, com pouco mais que as roupas que tinham no corpo, eu tinha 7 meses, o meu irmão 4 anos e a minha irmã 2. Mais um primo, com 3 anos, que estava a passar férias conosco. Os meus tios só souberam do paradeiro do filho deles já em Portugal... só sei tudo isto e outras histórias do que fui ouvindo em reuniões de família ou encontros de "retornados"...

Os meus pais tinham menos de 30 anos. Voltados a Portugal como refugiados de guerra, fomos chamados de "retornados", com certo tom depreciativo. A mim passou-me tudo ao lado...era criança e orgulhosa de dizer que tinha nascido em África. Também nunca liguei muito à parte política da questão...senti as injustiças que sofreram todas as partes envolvidas...

 Então o que faz alguém ser de uma nacionalidade?  E porquê se responsabiliza e acusa alguém pelos erros cometidos pelo governo político da sua nação? eu não sei, e não é uma identidade a que me apego... um passaporte ou uma cidadania só me servem para estar legal, acho eu... Geralmente quando perguntam de onde sou, tenho que contar uma história (como a maioria das pessoas na Europa de hoje)... digo que nasci em Angola, na terra dos Chokwé...cresci no Porto até aos 21 anos, viajei, vivi na linha de Sintra e em Lisboa por 7 anos e estou aqui no Monte dos Carvalhos, Póvoa da Atalaia, Fundão, desde 2006... O meu nome é Bárbara, que significa "estrangeira pela terra", ou "não-romana"...identifico-me com ambas as definições :-)

Sou branca com muita pena, pois sempre quis ser preta... Não sei porquê, coisas de criança, mas talvez por ter nascido em Angola e gostar do povo nativo... ou por ter uma mãe que é mais Angolana que portuguesa... Também sempre preferi me identificar com os que sofrem ou são descriminados, e talvez por ter visto desde a minha nascença, entre bombas e tiros, mutilados e muito sangue em corpos negros, as injustiças cometidas contra um povo que nada fez para o merecer...

É interessante esta questão da imigração e sua definição...

Nunca me vi como imigrante em Portugal, mas se calhar é outra definição do meu nome... ou serão os "retornados" considerados imigrantes por este autor beirão? Na verdade, segundo a sua apresentação, também ele foi exilado em França para fugir ao Fascismo... Não serão apenas nomes para o mesmo fenómeno que faz os humanos mudarem da sua terra para outra em busca de uma vida melhor ou mais segura ?

A razão que me trouxe a esta terra foi pura obediência, já que vivo ao serviço e com a direcção do Espírito desde 1998. Obediência a um chamado e um sonho divino (se é que ainda isto é compreendido nos dias de hoje sem que seja vinculado a uma Igreja, Ordem ou religião)... Serão imigrantes também os padres, as freiras e frades, os missionários e os ajudantes humanitários? Ou será que é algo tão alienado acreditar que Deus ainda existe, e ainda orquestra o movimento de gentes que se cruzam como que "por acaso"? Será já tão fictício imaginar um Ser Divino que tem planos muito maiores do que os nossos pequeninos sonhos, planos maiores do que "o progresso" e o desenvolvimento do interior de um país ?

"Deus quer, o homem sonha, a obra nasce." já dizia o grande poeta. Serão os imigrantes os sonhadores?

Não cresci nesta região, é certo, mas por acaso vim cá sempre pelo Natal, pois o meu tio, que também teve em Angola, é da Mó, uma aldeia perto de Alvito da Serra onde ainda me lembro de ter vindo à inauguração da electricidade... devia ter uns 12 anos.

Lembro-me de sair de manhã cedo do Porto e com sorte chegar para o jantar... lembro-me dos enjoos nas curvas, da Nacional 18 e do café central de Alpedrinha onde o meu pai tomava o seu último café antes de chegarmos a Castelo Branco... e o alivio ao ver a recta final com Plátanos que faziam como que um túnel na estrada, provavelmente entre a Lardosa e Alcains...

 O meu tio sempre foi e ainda é um senhor respeitado em Castelo Branco. Sempre honesto e trabalhador. Foi o dono do "Restaurante africano", onde a minha tia cozinhava, que foi o jeito de começarem uma nova vida longe daquela que amaram e tiveram que abandonar por várias ameaças de morte em Angola (tanto pela UNITA, MPLA ou FNLA, pelo que sei hoje, encorajados pelos revolucionários libertadores em Portugal)... As minhas primas, então adolescentes, também sofreram ameaças quando chegaram a Castelo Branco, mas eram dos homens...nunca mais quiseram usar mini-saias ou roupas coloridas que tanto estavam habituadas, a menos que se submetessem a serem tratadas como prostitutas no caminho para a escola...

Ainda sem casa, os meus tios dormiam por baixo de umas escadas no edifício onde era o restaurante.,,Como sempre foi honesto e respeitador de todos, o meu tio conseguiu um empréstimo no banco para comprar um terreno em Montalvão, nos arredores da cidade (no meio do nada, na altura, agora é a 5 minutos da "Decathlon"). O meu avô, veio erguer um prédio de 2 andares onde ainda hoje vive o meu tio Rodrigues que fez há pouco 90 anos.

Esse meu avô, Adelino Rosa, o querido pai da minha mãe, foi  grande empreiteiro, construtor, carpinteiro, pedreiro e bom trabalhador, tanto em Angola como aqui em Portugal.  Também gostava de beber e cantar à desgarrada, e apoiar o clube de Vale de Açores em Mortágua, de onde veio toda a família da minha mãe. Em Vale de Açores são (eram) quase todos ou "Rosa" ou "Simões" que era a família da minha avó Judite. Os Simões tiveram no Brasil, berço da minha avó que veio ainda bebé para Vale de Açores. Esta minha avó era das melhores agricultoras da aldeia. Eu ainda me lembro de ajudar a colher batatas, o milho e ajudar nas vindimas. Sempre providenciou toda a comida para a família, e até nós, quando íamos de visita do Porto, trazíamos a mala cheia de batatas, cebolas e outras coisas da horta dela. Casal perfeito para irem para Angola, para serem pioneiros numa pequena vila agrícola no meio de montes e selva, entre o povo Umbundo e Kikongo, como foi o Bocóio, a sul de Benguela, onde se estabeleceram e criaram 4 filhos.

Do lado da minha mãe tenho os pioneiros da terra: agricultores, construtores, e comerciantes que se estabeleciam onde quer que fossem...uns em Vale de Açores foram fervorosos Republicanos e até foram presos por defenderem esses ideais... 

Do outro lado,do meu pai, tenho os monarcas e os mais estudados... graças ao fim da monarquia e mais tarde ao meu avô João a nobreza já está longe... João Acácio da Nova Leite deixou a nobre família para começar uma nova, mais simples e modesta, em Angola, com uma linda mulher Malangina, com quem teve outros filhos... Uma delas, a tia Teresa, foi quem praticamente me criou, até à minha adolescência, enquanto os meus pais, como retornados, se matavam a trabalhar para recomeçar uma vida do nada, na cidade do Porto onde vivia a familia do meu pai. 


A nobreza tinha vindo da Croácia por Antun Pusic (aportuguesado para António Pusich)
, um oficial Naval de Ragusa (Dubrovnik), que veio servir a armada portuguesa a pedido do rei Português e até serviu vários encargos de relevo, entre os quais o de intendente e depois governador de Cabo Verde (1801 a 1822). Antonio tentou abolir a escravatura ali já que tinha a mente aberta dos Croatas que tinham abolido tal acto repugnante já no século XV no Reino de Dubrovnik, mas infelizmente sem sucesso. Parece que fez boas coisas por Cabo Verde onde ainda é lembrado hoje juntamente com a filha Antonia, mas não era muito aceite por outros oficiais portugueses por este ser "estrangeiro". António tinha casado com Ana Maria Isabel Nunes cuja família fazia parte dos serviços da casa real...(e um dos padrinhos de casamento foi o Marquês de Pombal, imaginem)... entre os vários filhos nasce Antónia Pusich já em Cabo Verde, onde toda a familia viveu...

Esta foi mãe de 11 filhos e 3 casamentos, foi poetiza, escritora, dramaturga, compositora e pianista, editora de várias publicações de jornais e revistas lisboetas. Foi a primeira mulher em Portugal no início do século XIX a fundar, possuir e dirigir jornais em Portugal. Uma mulher bem avançada para a época... portuguesa, ou não...eis a questão...mas participou bastante na vida e sociedade portuguesa de Lisboa, influenciando principalmente a emancipação das mulheres tanto na política como nas artes... Encontrei isto num artigo do Diário de Notícias sobre esta "famosa" antepassada minha: "quando o jornal Revolução de Setembro afirmou que as senhoras não deveriam escrever sobre política, esta mulher, que assistia muitas vezes às sessões parlamentares, insurgiu-se contra o ataque às capacidades do género feminino e respondeu num opúsculo intitulado Galeria das Senhoras na Câmara dos Senhores Deputados ou as Minhas Observações. Anos antes das ideias inovadoras da República sobre a independência das mulheres, já Antónia, mulher de orientação monárquica e religião católica, tinha defendido que as mulheres deviam aprender a ler e a escrever para poderem participar na vida social religiosa e política do país." E esta hein ?!

Tanto pai como filha, foram desprezados pelo Portugal liberal da altura... hoje são mais lembrados pelos Cabo Verdianos onde marcaram a sua presença.

Bem, podia continuar a descrever a presença portuguesa e o espirito migratório nos meus antepassados : pobres, ricos, lavradores e intelectuais, republicanos, monarcas e até brancos e pretos...

A minha identidade não está numa nação, numa terra, numa cidade, nem mesmo na minha orientação sexual como parece estar na moda nos dias de hoje (mais outra minoria descriminada...graças a Deus não criminalizada neste país). 

Sou da terra, pois nasci dela... mas sou também do Espírito, por isso pouco me diz o que as sociedades humanas determinam e definem...somos todos humanos, não há gregos nem troianos...Somos humanos e sempre andamos de um lado para o outro... As fronteiras são um conceito humano e não geográfico...muito menos natural...Sou humana no ecossistema onde habito, onde planto a minha comida, ou a encontro selvagem, dádiva do Criador...

Sou humana, e não sou pertença de nação alguma... Gosto de ser anarca e livre, e assim espero permanecer... Não sou Angolana, nem Portuguesa, nem Europeia, nem branca, nem só mulher...sou tudo e o que me quiserem chamar...sou única, como mais ninguém... como todos, como tu também... somos histórias, livros, filmes, narrativas que não param e que constroem o que é ser humanidade...

somos um...filhos (as) do homem e da mulher...não somos posse de ninguém muito menos um número fiscal...somos filhos (as) de Deus...filhos (as) da Terra.

Estou em terras do Fundão, e "a terra é de quem a trabalha",  certo? Já diziam os locais na Revolução... Aqui trabalho com o meu suor e as minhas mãos... Sou respeitada e aceite pelos meus vizinhos que também não param de trabalhar a terra para dela viverem... é o que se faz no campo... Nas províncias, como é chamado pelo urbano escritor

As árvores, plantas e os animais que me rodeiam reconhecem-me pois crescemos juntos, e isso para mim, hoje, é o que me faz sentir que pertenço... 

Este mundo não é só feito de humanos para humanos... este mundo tem outros sistemas que nos abraçam, que providenciam as nossas necessidades e cuidam de nós quando envelhecemos...

O lugar e a data em que nascemos dá-nos apenas um contexto da nossa história, a influencia dos Astros presentes talvez moldem a nossa personalidade, mas não nos dá identidade... essa construímos através das nossas vidas e escolhas...

somos humanos...e devíamos por direito ser todos legais...imaginem os animais migratórios terem que pedir vistos e direito de residência cada vez que viajam nas suas rotas naturais...

A questão do racismo, a descriminação e nacionalismo extremo é abordada neste livro por estar tão presente pelo mundo fora nestes dias que vivemos... mas que ignorantes ainda estamos numa parte do mundo que se diz tão inteligente... ainda não aprendemos com tantas histórias... e ainda continua a ser tão fácil manipular e espalhar o medo e a insegurança com narrativas repetidas...

Acho ao mesmo tempo irónico que a Europa seja tão xenófoba e resistente à imigração de pessoas provenientes de culturas que foram por nós colonizadas, destruídas e destabilizadas até hoje... Admiro-me nunca se falar da descolonização da América do Norte, do Canadá, da Austrália e Nova Zelândia, não é? Os Europeus estão pelo mundo fora e levaram a cultura e a religião que impuseram ao povos que oprimiram, perseguiram e destruiram... E agora não querem receber os outros? Mas que arrogância...O próprio Trump não me parece ser descendente de nenhum povo indígena do continente Americano, no entanto acha-se no direito de decidir quem pode entrar e quem tem que sair do país que governa, segundo um sistema importado em terra alheia... de quem é a terra afinal ? E quem dita quem tem direitos de pertencer ou não? Ficam aqui as minhas questões...


13 February 2025

eSpErAnçA...

 Quero escrever sobre ESPERANÇA...

a esperança que sempre alcança,
a esperança que não se pode perder
até me aperceber
que o que esperei sem ver,
como se já existisse,
está a começar a acontecer,
e dá-me esperança para esperar...
Esperar e preparar,
pois tudo tem que estar no seu lugar,
no lugar e tempo certos,
temos que estar sempre despertos...
conexão virtual,
conexão espiritual,
conexão na terra,
no céu, na água e no ar,
conexão no fogo
que está aqui para purificar,
separar e transformar...
temos que ver que o tempo está a chegar,
e o Reino da Paz virá para durar...

Temos filhinhos do papá
a reinar nações potentes,
mas o que não querem ver
é a resistência a crescer,
e a Verdade a transparecer...
Já não somos só alguns "loucos",
e já não somos assim tão poucos,
somos cada vez mais,
e de nós falam os jornais...
Venham Trampas e Putinhas,
venha Israel com acções mesquinhas,
a indignação está a crescer,
e quem se vai destruir
é aquele que não quer ver...
vítimas dos seus próprios meios de comunicação,
"fake news", propagandas e toda a manipulação,
ainda não repararam que estamos a mudar,
e a evoluir,
já temos mais direitos
e meios de nos unir...

o consumo é o poder nas nossas mãos,
se deixarmos de consumir
os produtores não escravizam os nossos irmãos
nem o planeta vão destruir...
já se cria comunidade
onde isto é verdade,
aumentamos a produção
e trocamos sem tostão,
(não acham uma curiosidade
que isto não passa na televisão? )
encorajamos uma vida simples,
aquela que sempre serviu
às comunidades ligadas à terra
e dependentes dela ...
cada bio-região
determina a dieta e a construção ,
produz o que é essencial
regenerando os recursos
em benefício da futura geração...
Todos sabemos compartilhar,
amar o próximo e perdoar,
todos a cuidar dos nossos anciões,
dos que curam e dos professores,
das crianças, viúvas, dos pobres e dos benfeitores,
e não esquecemos dos agricultores
não mais "pobres coitados",
mas reconhecidos e os mais abençoados,
por poderem viver
na terra de onde todos vamos comer...

É o que espero e acredito,
é o que escolho ver
em vez do que me é contado, visto ou escrito...
A Esperança vejo-a nos sinais da Primavera,
no fruto saboroso de cada época,
para quem ainda o espera,
na chuva, nas flores,
nos insectos polinizadores...

Só não vê quem não está acordado,
adormecido pela constante distração
que começou pela televisão...
hoje é tudo pela internet e telemóvel,
mais um jogo, mais um filme,
mais um berbequim, mais um imóvel...
necessidades sem parar,
que nunca foram precisas
até alguém as fabricar...
consumo é poder,
não vamos esquecer,
e vamos também votar
já que é assim que querem jogar...
Acordem Senhoras e Senhores
que se deixam levar por partidos sem valores,
já chega de conversas de manipulação
dizendo heresias com formato de religião,
dão ar de justiceiros,
mas usam o nome de Deus em vão ,
extremos à direita ou à esquerda
só querem separação...
no meio está a virtude,
no povo sem partido
e não dividido,
na tolerância, na paz, na solidariedade
na co-existência , no amor ao próximo e na igualdade,
em Espírito e em Verdade unido,
este povo jamais será vencido...